“A lição mais importante é que não nos deixemos determinar pelos limites”, diz Lareyne Almeida, autora do capítulo 10

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Autora do capítulo 10 do material didático do Curso, “Plano de Desenvolvimento Socioterritorial”, Lareyne Almeida fala nesta entrevista sobre os projetos que já participou, conta como essas experiências colaboraram para o processo de autoria e faz reflexões sobre o tema do capítulo.

 

Lareyne é Graduada em Ciências Sociais, especialista e mestra em Desenvolvimento e Gestão Social pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Tem experiência em projetos financiados pela União Europeia, Banco Mundial, Cooperação Italiana, governos locais e setor privado nos aspectos de estudos/ diagnósticos, planejamento integrado e participativo, execução e gerenciamento de ações sociais. É colaboradora da AVSI desde 2002, com a função atual de Responsável dos Projetos na Bahia.
Confira a entrevista completa abaixo:

 

1) Como foi sua trajetória profissional até chegar ao Curso do MCidades?

 

Minha trajetória profissional está completamente vinculada ao meu trabalho na Fundação AVSI (www.avsi.org) para onde fui com apenas um ano de formada e, em seguida, na AVSI-Brasil (www.avsibrasil.org.br). Há doze anos fui contratada pela Fundação para integrar a Unidade de Gestão do Projeto (UGP) do Projeto de Apoio Técnico e Social (PATS) ao Programa Ribeira Azul, um programa de desenvolvimento e redução de pobreza urbana realizado pelo Governo da Bahia para erradicar as palafitas e promover a melhoria das condições de vida de cerca de 135.000 pessoas e orçamento de 70 milhões de dólares.

 

O PATS era um projeto de cooperação internacional, com recursos de doação do Governo da Itália de cerca de 5 milhões de dólares à Aliança de Cidades e supervisão do Banco Mundial para apoiar o Ribeira Azul. A atuação da AVSI dizia respeito desde a gestão dos recursos, planejamento e execução de ações estratégicas que envolviam melhoramento urbano e regularização fundiária, desenvolvimento econômico e social e criação de capacidade institucional para programas de larga escala de redução da pobreza urbana. Foi um projeto muito arrojado, que nos permitiu experimentar várias metodologias, sendo uma grande fonte de aprendizado não só para mim, mas para todos aqueles que participaram. Acompanhando recentemente a equipe do NUTE para a filmagem da videoaula sobre Alagados do Curso do MCidades, uma das lideranças comunitárias me disse que sentia saudade desse projeto. E olha que terminou há 6 anos!

 

Depois disso tivemos várias experiências bonitas e ambiciosas e também, razão de ser das intervenções, com muitos impactos positivos nas vidas das pessoas, mas cito aqui o PATS porque vários trabalhos realizados (e aperfeiçoados) por nós depois, como o trabalho com organizações comunitárias, tiveram seu embrião nesse período.

 

2) Quais experiências durante a sua trajetória profissional mais colaboraram para o processo de autoria do capítulo? Por quê?

 

Posso afirmar que literalmente foi a síntese da maior parte das minhas experiências profissionais ter sido a responsável para o convite de integrar a equipe dos professores do Curso.

 

O Ministério tinha uma avaliação de haver no Brasil um conhecimento consolidado acerca do Trabalho Social realizado de suporte às famílias beneficiadas diretamente com as obras de urbanização, mas que havia uma necessidade de promoção e fortalecimento do repertório de metodologias sociais relativos ao conhecimento e planejamento integrados, fortalecimento da sociedade civil e geração de trabalho e renda.

 

Assim, em 2012, fizemos um trabalho com a Aliança de Cidades e a Secretária Nacional de Habitação de sistematização das experiências da AVSI nas áreas de interesse, gerando uma publicação, integrada por 3 pequenos volumes, intitulada kit temático “Trabalho Social em Programas e Projetos de Habitação de Interesse Social”. Foi um trabalho rico que nos permitiu refletir e sistematizar sobre nossa prática, assim como também, creio eu, para o Ministério, também envolvido com a elaboração da normativa. Esse processo de elaboração duplo, com as dúvidas e questionamentos naturais intrínsecos a trabalhos dessa natureza, terminou por enriquecer ambos os documentos.

 

3) O que você identifica como maior desafio ao criar um Plano de Desenvolvimento Socioterritorial (PDST)?

 

A ambição do PDST é ser um instrumento de planejamento e de orientação de ações intersetoriais de uma parte da cidade (macroárea). O maior desafio é ser elaborado, em um ambiente político, não apenas para cumprir uma obrigatoriedade da normativa, onde haja uma real vontade de fazê-lo.

 

Isso implica decisão política, tempo para articulação intersetorial, execução das ações articuladas, ou seja, priorização real das ações previstas por parte de vários órgãos, envolvimento do setor privado e, claro, condições adequadas de trabalho para a equipe social e competência dessa equipe para produzi-lo. Ou seja, um conjunto de fatores para responder a um único desafio: decisão de fazê-lo.

 

4) Que mecanismos e ações podem ser aplicados para o aprimoramento do PDST? Você tem alguma experiência que foi bem sucedida e sirva como um bom exemplo?

 

O PDST é uma figura nova do trabalho social, sendo uma das inovações da normativa. Portanto, parece-me precipitado indicar mecanismos e ações para seu aprimoramento, sem antes analisar os planos produzidos nos próximos 12 meses. A partir desta leva, teremos elementos para dar indicações claras. Agora, podemos levantar algumas hipóteses: i) inserção de recursos para execução (hoje não é previsto orçamento dentro do projeto de trabalho social para ações, mas apenas para sua elaboração); ii) mais treinamento para as equipes sociais; iii) fusão do Projeto de Trabalho Social (PTS) com o PDST. Como antecipado no texto da aula, ainda se pensa o projeto em termos da área de intervenção e agora a equipe é demandada a refletir sobre a macroárea. O ideal é atuar sobre uma única unidade territorial (a macro), com um investimento mais intenso nas áreas de intervenção, porém sabemos que para atingir esse nível várias discussões têm de ser vencidas, a exemplo do cálculo do investimento a receber e a compatibilização do trabalho de planejamento com o acompanhamento social em decorrência das obras.

 

Sobre minha experiência particular, participei de várias iniciativas com tentativas de articulação para além da execução imediata da intervenção. Posso garantir que vale a pena a tentativa. O projeto enriquece, há uma economia de recursos, mais pessoas e atores envolvidos, há um senso de responsabilidade mais disseminado, e a população é melhor atendida.

 

Apenas para dar um exemplo recente, estamos envolvidos em um projeto de Responsabilidade Social Corporativa no recôncavo baiano onde foi feito um plano muito semelhante ao PDST. Uma empresa construirá um centro multifuncional em uma área muito pobre, a Prefeitura dará o transporte, o SENAI (via Pronatec) ofereceu uma turma de capacitação em eletricista predial para 40 moradores da área (o projeto por sua vez realizou a seleção das pessoas, inclusive com participação de psicólogos, ofertou transporte, a disciplina de Formação Humana para acentuar o trabalho sobre postura profissional, comportamento, autoconhecimento etc e está fazendo um trabalho de levantamento de vagas de trabalho para encaminhamento). O projeto construirá uma Casa de Farinha, mas uma escola técnica dará o curso para aprimorar a capacidade de produção dos produtores, bem como dará a orientação técnica para a construção da casa.

 

5) O que você espera como resultado do Curso, levando em conta o capítulo que você produziu e sua participação? O que você destacaria para os estudantes como lição mais importante?

 

Antes de falar nos resultados do Curso, não resisto a mencionar a experiência fantástica desse Curso, que atinge simultaneamente 5.000 profissionais de todo o país, com a tecnologia e equipes envolvidas e troca de conhecimento e experiências geradas. Como resultado do Curso, tenho certeza de que contribuímos com profissionais mais capacitados (uma grande demanda do setor), mas espero também termos gerado um grupo de pessoas mais sensibilizado sobre a importância do Trabalho Social como instrumento de transformação da vida dos moradores de onde trabalhamos.

 

Aos estudantes diria que a lição mais importante (e que não está no texto) é que não nos deixemos determinar pelos limites, sejam eles quais forem: da normativa, dos financiamentos, das condições muitas vezes restritivas do trabalho. Apostem nas brechas, nas oportunidades, na articulação, na sua própria criatividade, aliem-se a colegas que pensam como vocês e construam belos projetos. Insistam nisso, não será fácil, mas terão muito aprendizado e satisfação como retorno.

 

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